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É Natal, mas não me encaixo na minha família. Sinto-me um peixe fora d’água. Não amo todos meus parentes e nem tenho que amar

Hoje é véspera de Natal: rabanada, frango e sempre alguém muito “bacana” para colocar passas em tudo. O pior vem agora: a obrigação de ter de ir se reunir com a família.

Reunião de família? Qual família? Muitas vezes, você se vê obrigado a estar com pessoas que não reconhece mais, não sabem nada da sua vida, não procuram por você, não aceitam quem você é, questionam e julgam a forma com a qual você vê o mundo, fazem piadas escrotas sobre você, nunca motivam ou dão parabéns.Ou quando dão parabéns, é tão seco, tão frio, mas para falar mal, usam o vocabulário todo, não deixam você dar a sua opinião, não veem por inteiro, não conheceme nem dão a chance de conhecer você, porque só pensam neles e nos seus problemas, não têm o mínimo interesse em você, ou mesmo, de fazer perguntas como: como você está? O que tem feito? O que você pensa sobre tal assunto?Alguns até falam de você, outros nem vão com a sua cara.

      É essa gente que estamos preocupados em agradar? E ser “boa praça”? Isso não é família, mano. É um monte de gente desconhecida reunida. Não seria mais interessante se reunir com quem hoje faz sentido na sua vida? Que família é essa que queremos manter a todo custo? Para que esse esforço todo? Por que não aceitar o fato de que ela não existe mais? Chega, aceite! Agora só temos o passado. E nem sempre juntar o passado numa sala de jantar faz sentido, mesmo se tiver pudim.

       Todos ali juntos reunidos fingindo ser o que não são. Todos interpretando o papel de família. Quanto estão nos pagando por esse papel? Sorrisos falsos, fingir interesse pelo outro, rir da piada chata, abraçar desconhecidos. É um circo ou um teatro?Estou me decidindo.

Forcei tanto que as minhas famílias estivessem unidas. E sabe por que não deu certo? Eles não queriam o que eu queria. Eles não são obrigados a me amar e amar os outros parentes. Cada um já havia escolhido a família que melhor lhe cabia. Não me encaixava ali. Por que ficar em um lugar em que você não cabe? Só você liga, só você se preocupa, só você manda mensagem.

   Hoje, também estou decidindo. Não interessa se é tio, sogro, irmão, cunhada, prima… Se não tiver afeto, diálogo e reciprocidade, não movo uma palha do meu corpão.  Não gosto de os todos meus parentes. Tenho ranço, preguiça. E, certamente, alguns têm de mim também. Quem disse que é obrigatório amar nossa família?

      A primeira família, a gente não escolhe. Por isso, fatalmente, vai acontecer de não rolar química entre um membro ou outro. Bobo é a gente de acreditar: só porque é sangue está tudo resolvido. Sangue não significa porra nenhuma. Essa primeira família são como os colegas da escola: a gente vai convivendo obrigatoriamente, vai odiando uns e amando outros. A diferença é que,para os colegas da escola, está liberado ter ranço e nunca mais ver. Quanto àfamília, parece que é meio proibido não querer ter mais contato ou, simplesmente, não gostar da pessoa.

      Mas qual a diferença? Eu amo um colega meu pelas atitudes, não por conta de ser um colega. Você ama sua mãe peloque é para você, não exatamente pelo fato de ela ter posto você no mundo. Por que diabos vou amar alguém por ser irmão da minha mãe? O que, de fato, temos em comum é minha mãe, apenas. Tenho certeza de que você tem amigos que não são amigos entre si. Não estou dizendo que odeio, calma, gente!Mas, na verdade, que não amo, que não tenho afeto e nenhuma vontade de estar junto.

    Eles também sentem a mesma coisa, no entanto, quase ninguém tem coragem de dizer isso. Não se sinta culpado de não amar alguém que não regou a planta, que não cultivou a relação.

    Agora caiu a minha ficha de que minha família mesmo tem umas 10 pessoas. Não são perfeitos, nem eu sou, MAS são pessoas que, constantemente, fazem algum movimento em minha direção, e eu a elas. São pessoas que não aparecem só na hora da tristeza como muito parente aparece. São aquelasque vibram com minhas conquistas. Erram, acertam, mas me fazem perceber que estão comigo.

Portanto, não fique triste se a família primária não existe como você imaginou. Celebre a família que tem hoje. Família que pode ou não ter seu sangue. Pode ou não viver na mesma casa, que pode ser uma amiga ou uma vizinha.

Eu me lembrei de um parente que amei tanto, procurei, ouvi, estive perto. Mesmo sendo muito diferente de mim. Eu o amava. E, no fundo, sei que ele não queria o amor que eu estava disposto a lhe dar. Ele não quis. Paciência. Também tem isso: tem gente que não quer o seu amor, seja por qual motivo for. Dói um pouco, mas é a realidade. Tem aquelesque a gente ama e não nos quer. O que vou fazer? Continuar vivendo a minha vida e deixar ir. Ele já me deixou ir há muito tempo. Agora é minha vez.

Deixe ir essa família de mentira.

Deixe ir esse familiar que não te ama.

Deixe ir esse afeto que não tem reciprocidade.

Dê o seu melhor para quem quer.

Não pare de amar, só canalize seu amor na direção certa.

Opa, que alívio dizer tudo isso. Agora vou comer uma rabanada com a galera aqui, uma desculpa perfeita para estar perto das pessoas que realmente importam.

Texto de @lucarvalhoescritor